O dispositivo que prevê acordo entre o Ministério Público e o acusado de crimes, após a denúncia e antes do processo começar a correr, foi considerado pelo presidente da OAB/DF, Délio Lins e Silva Junior, e outros criminalistas como um dos mais problemáticos entre os previstos no pacote intitulado “anti-crime”, atualmente em discussão no Congresso Nacional.
As três propostas que compõem o volume – dois projetos de lei e um projeto de lei complementar – foram apresentadas ao Legislativo pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, na primeira semana de fevereiro, e debatidas por criminalistas nesta quarta-feira (3/4), em encontro na Subseção de Taguatinga da seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF).
“O artigo da proposta que traz esta previsão se desdobra em requisitos e incisos altamente subjetivos, como o que diz que as penas poderão ser diminuídas em até a metade, inclusive com a alteração do regime de cumprimento, segundo a gravidade do crime, as circunstâncias do caso e o grau de colaboração do acusado. O que há de objetivo nisso? Nada. Deixar isso na mão das autoridades que estão formulando a ação é um risco enorme, uma temeridade”, sentenciou o presidente da seccional Délio Lins e Silva Junior, advogado criminalista com várias obras publicadas em sua área de atuação.
“Eu não consigo imaginar um funcionamento prático disso, simplesmente porque há muitos exageros na aplicação da lei”, acrescentou Sérgio Antonino Fonseca, criminalista com atuação em inúmeros processos e que presidiu a Subseção de Taguatinga no triênio 1995/1998.
Para o presidente da Subseção de Taguatinga, Cleider Rodrigues Fernandes, que advoga há 21 anos e dá aulas desde 2001, o dispositivo, conhecido como “ple bargain”, vai enfraquecer a magistratura e fortalecer o Ministério Público, se aprovado. “Essa é minha maior crítica a este projeto. A lei fortalece ainda mais o Ministério Público, a parte acusatória, e alberga um único olhar, que não é o de Estado, mas o de uma carreira”, disse.
“Estamos diante de um projeto que corta direitos, suprime recursos e coloca o Ministério Público, que já está aparelhado, na posição de fazer acordos sem critérios claros, enquanto a advocacia vem sendo criminalizada”, emendou Flávio Fonseca, presidente da Comissão de Ciências Criminais da Subseção de Taguatinga. Ao abrir o debate, ele criticou ainda o instituto das delações premiadas. “Estamos em um tempo em que a prova não é mais necessária. É preciso apenas um delator e um promotor com Power Point”, disse.
Direitos Sociais
Ao longo do debate, Délio Lins e Silva Junior apresentou um panorama das reformas criminais debatidas pelo Congresso Nacional nos últimos anos e criticou a ausência do debate na formulação da atual proposta. “Desde 2011, várias reformas foram apresentadas. Perdemos, inclusive, grandes oportunidades de avançar em questões importantes, que foram engavetadas por incompatibilidade de egos, mas houve amplo debate em todas elas”, lembrou. “Desta vez, não. O projeto foi gerado dentro de um gabinete, sem participação das polícias, da academia, das magistraturas, das advocacias, dos ministérios públicos, e empurrado goela abaixo de toda a sociedade”, afirmou.
O presidente da OAB/DF lançou aos presentes a reflexão sobre os limites do Direito Penal na solução de problemas sociais. “Enquanto a nossa classe política não perceber que os problemas do país são maiores que o Direito Penal, nossa sociedade não vai evoluir. Devíamos estar discutindo saúde, moradia, educação, mas, ao contrário, estamos preocupados em aumentar pena, em encarcerar as pessoas. Para mim, os valores estão invertidos”, defendeu.
Participaram também do debate o secretário-geral da OAB/DF, Márcio Oliveira, o presidente da Caixa de Assistência dos Advogados do Distrito Federal (CAADF), Eduardo Uchôa, a vice-presidente da Subseção de Taguatinga, Michelle Castro de Araújo, e o ex-presidente da Subseção, Nadim Tanus. Acompanharam a discussão representantes da diretoria da Subseção de Taguatinga, de outras Subseções e conselheiros.
Conheça as proposições do pacote:
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