A tradicional ala de acesso às salas da diretoria do quarto andar da sede da OAB/DF vai se transformar em um espaço histórico nesta quinta-feira (24/10). O corredor largo vai ganhar fotos antigas recuperadas, objetos que contam a história da Seccional e o título de Galeria Sigmaringa Seixas, em homenagem ao advogado Antônio Carlos Sigmaringa Seixas, que dirigiu a Ordem de 1973 a 1975, e seu filho Luís Carlos Sigmaringa Seixas, conselheiro da Seccional e deputado constituinte.
Os dois ilustram, ao lado de Maurício Correia, uma das imagens históricas da OAB/DF: o cordão de resistência formado por advogados durante a tomada do prédio pelos militares, em 24 de outubro de 1983, período da ditadura. A inauguração da ala acontece no atual 24 de outubro, exatamente 36 anos depois.
“Quando iniciamos a gestão, encontramos antigos quadros e fotos da OAB/DF abandonados no subsolo, em uma sala com mofo e sem ventilação. Decidimos recuperar esta memória com a curadoria do nosso fotógrafo oficial, Valter Zica, que está na Casa há mais de dez anos. Este era um desejo também da Comissão de Memória e Verdade, que nos trouxe a ideia da homenagem aos Sigmaringa, que ilustram boa parte destas imagens. São advogados que fizeram muito pela Ordem e representam no plano nacional a luta incansável pela democracia”, conta o presidente da OAB/DF, Délio Lins e Silva Júnior.
“A homenagem a estes dois advogados que simbolizam resistência ao arbítrio, defesa da liberdade e luta pelo estado democrático de Direito, nesta data simbólica em que é relembrada a interdição de nossa sede pelo governo militar, há 36 anos, é um ato destinado sobretudo às novas gerações de advogados e advogadas. Antônio Carlos Sigmaringa Seixas e Luiz Carlos Sigmaringa Seixas são inspirações para a advocacia brasileira que tem como principal mister a defesa da sociedade e da democracia”, afirma Maria Victoria Hernandez Lerner, que preside a Comissão de Memória e Verdade da OAB/DF.
Em agosto deste ano, o presidente Délio Lins e Silva Júnior criou, por meio de portaria, grupo de trabalho para avaliar o achado de fotografias históricas encontradas no 2o subsolo, que inclui centenas de imagens de diferentes épocas da Seccional. Integram o grupo representantes da Comissão de Memória e Verdade, da Comissão de Direitos Humanos e da Comissão da advocacia Jovem e Iniciante.
Em uma primeira análise do material, após resgate das imagens no subsolo realizado pelo fotógrafo Valter Zica, a Comissão de Memória e Verdade, indicou a variedade do conteúdo: são imagens de autoridades, visitas a espaços públicos, a subseções, a construções prediais da sede e de eventos como congressos, seminários, reuniões, solenidade de posse, entregas de carteira, premiações. A OAB/DF vem buscando parcerias para dar o devido tratamento arquivístico a todo o material.
60 anos
A inauguração da Galeria Sigmaringa Seixas está marcada para às 19h30 desta quinta-feira (24/10) e inaugura os preparativos para os 60 anos da OAB/DF, que instalou sua sede na capital da República em 25 de maio de 1960, poucos dias após a inauguração de Brasília. Funcionários da Seccional trabalham nos últimos ajustes para que a OAB/DF possa receber advogados e advogadas, amigos e colegas dos Sigmaringa e de outros presidentes e conselheiros que passaram pela Casa.
A imagem histórica dos Sigmaringa com os os braços entrelaçados em frente ao prédio cantando o hino nacional é uma delas. “Os elevadores já estavam desligados, o prédio tomado por policiais, não havia o que fazer. O presidente Maurício Correia e os conselheiros desceram pelas escadas. Eu ainda tentei desligar as máquinas de café, mas ele me puxou, me pediu para sair logo. Hoje entendo a pressa dele”, lembra João Rocha de Paula, o funcionário em atividade mais antigo da OAB/DF. Ele está na Seccional desde 1971 e acompanhou toda a cena da ocupação, assim como outras, inclusive a construção do atual prédio.
Pai e filho
Antonio Carlos Sigmaringa Seixas nasceu em 26 de março de 1921, na cidade Campos, no Rio de Janeiro. Em 1944 formou-se em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito de Niterói e foi Procurador-Geral do Estado do Rio de Janeiro por duas gestões, sendo o responsável pela a elaboração do anteprojeto da Lei Orgânica do Ministério Público e da Assistência Judiciária (Lei 5.111 de 1962).
Em meio a sua segunda gestão (1963-1964), dias após o Golpe Militar, foi preso e exonerado. Depois disso, fixou residência em Brasília, dedicando-se à advocacia e à militância pelos direitos humanos.
Como advogado atuou incansavelmente contra as arbitrariedades praticadas pela ditadura militar, forjado na convicção de que a advocacia é uma profissão mas também a representação de uma função social. Defendeu presos políticos, sindicalistas e estudantes perseguidos pela ditadura, chegando a abrigar em sua própria casa alguns desses perseguidos políticos.
Foi membro fundador do Instituto dos Advogados de Brasília, conselheiro da OAB-DF em 1970 e presidente da entidade entre os anos de 1973 e 1975. Por sua atuação, foi referência em Brasília na luta pela anistia, pela redemocratização e pelos Direitos Humanos, fundando o Centro Brasil Democrático (Cebrade) e atuando na formação dos comitês de anistia.
Em 1983, foi um dos líderes do movimento que impediu a invasão da OAB-DF, determinada pelo regime. Orientou o então presidente Maurício Corrêa a não receber a notificação da Polícia Federal. De braços dados, eles se posicionaram em frente ao prédio da entidade.
O advogado morreu em 14 de janeiro de 2018, aos 94 anos, deixando sete filhos, entre eles Luiz Carlos Sigmaringa Seixas.
Constituinte
Luiz Carlos Sigmaringa Seixas nasceu em 7 de novembro de 1944, na cidade de Niterói, no Rio de Janeiro. Em 1964, ingressou no curso de Administração da Escola Brasileira de Administração Pública (EBAP), da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ), e na Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF). Após completar os estudos, Sigmaringa mudou-se para Brasília, seguindo os passos de seu pai, que havia se mudado para a cidade, após ter sido preso no Rio de Janeiro por se opor ao Golpe de 64.
Como advogado foi figura de destaque no enfrentamento ao regime militar na capital federal. Nas décadas de 1970 e 80, defendeu presos políticos, sindicalistas e estudantes perseguidos pela ditadura. Em 1976 tornou-se conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) — seção do Distrito Federal, função que exerceria até 1984, e membro da Comissão de Direitos Humanos (1980-1984).
Ao lado de Eny Raimundo Moreira, Luiz Eduardo Greenhalgh, Mario Simas, Paulo Vanucchi dentre outros, Sigmaringa Seixas foi um dos idealizadores e coordenadores do Projeto que resultou no livro “Brasil: Nunca Mais”, lançado em 1985. Coube a ele a operação de extração de cópias dos processos no Superior Tribunal Militar.
Entre 1980 e 1983, foi consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz e da Anistia Internacional. Nesse mesmo período, fundou o Comitê Brasileiro de Anistia em Brasília, do qual foi vice-presidente.
Foi nomeado diretor do Departamento Federal de Justiça do Ministério da Justiça, na gestão de Fernando Lira (1985-1986) em 1985, posto que ocupou até 1986, quando foi eleito Deputado Federal Constituinte pelo PMDB. Integrou a Comissão da Organização do Estado, na qual foi Relator da subcomissão da União, Distrito Federal e Territórios. Foi no exercício dessa relatoria que elaborou o projeto que garantiu a autonomia política ao Distrito Federal. Participou, ainda, como membro titular, da Comissão de Sistematização e, como suplente, da Subcomissão da Nacionalidade, da Soberania e das Relações Internacionais, da Comissão da Soberania e dos Direitos e Garantias do Homem e da Mulher.
Em 1988, por não concordar com as posições do partido, deixou o PMDB, para fundar, no Distrito Federal, o recém-criado Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB), agremiação pela qual foi reeleito no pleito de 1990. Em sua segunda passagem pelo Congresso, teve atuação destacada na Comissão Parlamentar de Inquérito do caso P. C. e como relator da Subcomissão de Emendas Orçamentárias da CPI dos “anões do orçamento”.
Em junho de 1997, deixou o PSDB para ingressar no Partido dos Trabalhadores (PT). Reeleito deputado federal pelo PT em 2002, foi presidente da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Casou-se com Marina Luce de Carvalho, com quem teve dois filhos.