Por: Luiz Cesar Barbosa Lopes*
O exame que a Ordem dos Advogados do Brasil aplica a todos os interessados e a alguns vocacionados a exercerem a advocacia voltou a ser alvo de críticas após mais uma série de reprovações em massa.
Ainda, como nem tudo o que é necessário satisfaz a todos, o Exame de Ordem ganhou os noticiários depois que o desembargador federal do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, Sr. Vladimir Souza Carvalho, exarou decisão no sentido de permitir a dois bacharéis em direito a inscrição nos quadros da OAB sem a necessidade de se submeterem ao exame.
O presidente da OAB, Ophir Cavalcante, saiu prontamente em defesa do exame, tendo explanado que o este visa, primordialmente, à proteção da sociedade.
O que não mereceu tanta importância da imprensa foi o fato de que o filho do desembargador federal contrário ao exame da OAB já fora reprovado quatro vezes, o que por si demonstra o absurdo casuísmo de que se revestiu a atuação do nobre magistrado, exteriorizando, ainda, a flagrante ilegalidade e inconstitucionalidade presentes numa decisão que amparou a pretensão de poucos em detrimento da segurança de toda a sociedade.
O ilustre desembargador não atentou para o fato de que abolir o Exame de Ordem é um retrocesso sem precedentes, não sendo plausível balizar posicionamento a ele contrário na circunstância de não ser exigido exame para o exercício de outras profissões.
Ora, que se exijam exames para todas as outras profissões, como já o fez o Conselho Federal de Contabilidade, amparado pela Lei nº 12.249/2010, mas que não se atente contra uma exigência que tem a finalidade de evitar ou, pelo menos, minimizar a possibilidade de a sociedade ser prejudicada em decorrência da atuação de pessoas despreparadas para a advocacia, ou seja, que nunca foram vocacionadas a advogar.
Não defendo o exame por já ser advogado, mas por ter a consciência de que a maioria daqueles que sentam nos bancos acadêmicos do curso de Direito o fazem pensando em tudo, menos em advogar, sendo que no final do curso todos correm para se submeterem ao Exame de Ordem com o pensamento de que a advocacia é um ´´bico´´ e a sociedade a ´´cobaia´´, o que justifica o considerável percentual de reprovação dos bacharéis, pois esquecem que o verdadeiro advogado deve ser vocacionado, tendo sempre o árduo dever de ´´subordinar o seu ministério privado à elevada função pública que exerce.´´
O exame da OAB precisa, sim, ser aprimorado, talvez para chegar ao nível de excelência dos aplicados nos Estados Unidos da América, onde não se exige um, mas vários exames para fins de avaliar a aptidão dos candidatos para o exercício da advocacia (ex: Bar Examination; Multistate Bar Exam; Multistate Essay Exam; Multitaste Perfomance Test etc.), mas a abolição do exame no Brasil só surge como voz daqueles que encaram a advocacia como uma profissão qualquer, em que ganhar ou tentar ganhar dinheiro é o objetivo principal, e a sociedade que se ´´exploda´´.
A posição que manifesto em favor do exame trago desde os tempos da faculdade, sendo que antes de me submeter a ele tive o privilégio de debater com o senador Gilvam Borges o projeto de lei complementar de sua autoria que tem por objeto justamente a extinção do Exame de Ordem, momento em que pude manifestar-me acerca da impertinência de um projeto tão nefasto para a sociedade.
É importante asseverar que todos aqueles contrários ao exame da OAB, inclusive o desembargador Vladimir, pecam ao concluírem que o curso de Direito forma, automaticamente, advogados. Pasmem! O curso de Direito ou de Ciências Jurídicas aplicadas não recebeu, em momento algum, a nomenclatura de ´´Curso de Advocacia´´, sendo que a mesma lógica utilizada para concluir que o curso não forma juízes, promotores, delegados etc. deve aplicada para inferir que o curso não forma advogados.
Duvido que o ilustre desembargador Vladimir, ou qualquer outra pessoa, coloque nas mãos de um bacharel várias vezes reprovado no exame da OAB um caso que envolva seu patrimônio, sua liberdade ou até mesmo sua vida.
Imaginem uma pessoa que está prestes a ver sua casa derrubada de forma ilegal pela administração pública; uma pessoa que foi presa ilegal e arbitrariamente por policiais corruptos; uma pessoa que necessita de um medicamento específico para poder viver; uma pessoa que necessita de um leito de UTI e tem seu direito negado pelo Estado. Imaginem todas elas nas mãos de um bacharel em Direito que, durante todo o curso, esteve sob as calças do pai e não cuidou de se aprofundar nos estudos das ciências jurídicas. Imaginem essas pessoas nas mãos de um bacharel que não teve a capacidade de lograr aprovação num exame que exige o mínimo de conhecimento jurídico.
É muito provável que esse bacharel, da mesma forma que no Exame de Ordem não sabe o que fazer em decorrência da carência do mínimo de conhecimento jurídico e deixa a casa ser derrubada, permita o cerceamento arbitrário de liberdade, seja omisso e relapso ao ponto de ver a chegada da morte daquela pessoa que necessita de intervenção judicial para garantir medicamentos essenciais à continuidade de sua existência ou para determinar ao Estado o fornecimento de um leito de UTI para o amparo da vida.
Talvez o desembargador Vladimir aceite correr esses riscos, mas ele não pode impor tais riscos à sociedade.
O exame da OAB tem por condão impedir a mácula ao artigo 133 da Constituição Federal e, ainda, ao serviço público e à função social inerentes ao exercício da advocacia previstos no parágrafo primeiro do artigo segundo da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil).
Assim, advocacia é muito mais do que profissão. É atividade indispensável à administração da justiça, é serviço público essencial para o nobre exercício de função social.
* Luiz Cesar Barbosa Lopes é advogado, pós-graduado em Direito Penal, orientador do Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade Unieuro, membro associado do Movimento em Defesa da Advocacia – MDA, e especialista em Direito Eleitoral.