A presidente da OAB-DF, Estefânia Viveiros, prestigiou os formandos de Direito do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) na última sexta-feira (17). Estefânia
foi professora da turma A e foi convidada para ser patrona dos bacharéis. O senador José Sarney foi padrinho dos formandos e o professor Márcio Cruz, paraninfo.
No seu discurso, a presidente ressaltou a luta das mulheres pela “igualdade natural entre os sexos” diante de uma turma em que 63 dos 80 formandos eram do sexo feminino. A solenidade foi realizada na Academia Music Hall.
Confira o discurso proferido pela presidente:
Queridas e queridos formandos, Senhoras e Senhores,
Antes de iniciar este meu breve pronunciamento, gostaria de fazer uma confissão, que é também uma forma de extravasar a emoção que toma conta de mim: como presidente da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal, já falei diante de inúmeras platéias. Mas esta é a primeira vez que o faço na condição de patrona de uma turma de formandos.
Minha mais sincera gratidão.
E que turma! De 80 formandos, 63 são mulheres. Não por acaso, escolheram, por nome, “Turma Anita Garibaldi”. Uma justa homenagem à mulher que sonha, que luta, que faz.
Quando tomei posse na OAB, em meu discurso lembrei as mulheres de meu Estado de origem – o Rio Grande do Norte – que também fizeram história:
Nísia Floresta, poetisa e educadora, escreveu o primeiro manifesto feminista, quando ser feminista ainda era assunto de polícia. Auta de Souza, precursora do movimento modernista de 1922. Celina Guimarães, a primeira mulher a votar na América do Sul (isso foi em 1927). Alzira Soriano, da pequena cidade de Lages, a primeira mulher a ser eleita prefeita, em 1929. Lembrei também Maria do Céu Fernandes, a primeira mulher eleita para uma Assembléia Legislativa, em 1950.
Este não é um discurso feminista. Cito agora esses nomes apenas com o objetivo de enaltecer a lembrança de Anita Garibaldi, que ao lado de tantas outras bravas mulheres, muitas das quais anônimas, abriram caminho para um Brasil menos desigual, mais justo, mais solidário, mais tolerante.
Anita é símbolo porque soube sintetizar, como nenhuma outra, o papel da mulher revolucionária: foi soldado, enfermeira, esposa e mãe. Travou, até a morte, a batalha em nome da liberdade e da justiça – inicialmente, na luta contra o Império no Brasil, na Guerra dos Farrapos, no Sul do País; depois, no Uruguai; e, por fim, nas sangrentas lutas pela unificação da Itália. E em meio a tudo isso, protaganizou uma das mais belas histórias de amor que o mundo já viu.
Não é exagero pensar que, se aqui estivesse, Anita muito se orgulharia. Também não é exagero imaginar que ela continuaria lutando, pois liberdade e democracia são obras inacabadas, precisam que todos nós – mulheres, homens – estejamos sempre vigilantes. Os ideais de Anita Garibaldi precisam se manter vivos em um mundo cada vez mais competitivo e ainda marcado por preconceitos e desconfianças.
A nossa Constituição, em seu Artigo 5º, inciso I, diz que todos são iguais perante a Lei. Nós, mulheres, sabemos o caminho que tivemos de percorrer para que isso se tornasse realidade. Desde o Século Dezessete, quando se originaram os movimentos feministas como ação política, as mulheres vêm lutando para pôr essa Lei em prática.
Só recentemente é que a legislação brasileira introduziu mecanismos com o objetivo de diminuir as desigualdades entre homens e mulheres nas relações de trabalho. Foi a partir da Constituição de 1932 que ficou estabelecida a proibição do trabalho da mulher grávida durante o período de quatro semanas antes do parto e quatro semanas depois. E também que é proibido despedir mulher grávida pelo simples fato da gravidez.
Mesmo assim, algumas formas de exploração ainda perduram, baseadas no mito de que o homem trabalha para sustentar a mulher. Infelizmente, a idéia de que a mulher deve ser submissa ainda encontra ecos na cultura e na educação da sociedade. É algo que precisamos combater com todas as forças.
Entre as discriminações que as mulheres ainda enfrentam estão violações às suas prerrogativas profissionais, especialmente na advocacia criminal, no trato das mulheres nas delegacias. As advogadas de primeira instância também relatam terem sido menosprezadas por juízes.
Mas os tempos estão mudando – e com que velocidade!
Na advocacia, a mulher tem uma forte participação nas estatísticas da Ordem dos Advogados do Brasil. De 500 mil profissionais na ativa no Brasil, 42% são mulheres. No Distrito Federal, os números do recadastramento feito pelo Conselho Federal da OAB em 2003 apontavam o seguinte: 7.132 advogados contra 4.563 advogadas. Na faixa com até cinco anos de profissão, o número de advogados no Distrito Federal é de 2.447, contra 2.009 advogadas. Temos indicações de que essa diferença já não existe mais, e esta Turma é uma prova disso.
Nunca se viu tantas advogadas como agora nos tribunais, em cargos de magistratura e dentro do Ministério Público. De acordo com os dados do Tribunal Superior do Trabalho, por exemplo, as mulheres já ocupam 43,1% das vagas nas Varas do Trabalho, 41,9% dos postos na Justiça do Trabalho e 37,1% das colocações nos Tribunais Regionais do Trabalho em todo o país.
Em resumo, as mulheres estão despertando e tomando cada vez mais consciência de sua força e capacidade.
É assim que se muda história. Tenho orgulho de viver este tempo e de contribuir para estas mudanças. Sou a única mulher a presidir uma Seccional da OAB, mas tenho a esperança de que em breve teremos outras, muitas outras, a ocupar este cargo.
Na verdade, essa busca constante por um lugar ao sol não deveria ser necessária. Já está mais do que provado que as mulheres são perfeitamente capazes de cuidar de si, de conquistar aquilo que desejam e de provocar mudanças profundas no curso da história. Exatamente como os homens!
Nada queremos a não ser o reconhecimento da igualdade natural entre os sexos. Afinal, a igualdade na diferença. Creio que foi esse o legado da revolucionária Anita Garibaldi.
Encerro homenageando a todas as mulheres lutadoras aqui presentes com os versos de uma poetisa de muita sensibilidade, nascida nos sertões de Goiás, não muito longe daqui. Cora Coralina:
“Eu sou aquela mulher que fez a escalada da montanha da vida removendo pedras e plantando flores”.
Muito obrigada!