Artigo: “Sejamos democratas”, Délio Lins e Silva Jr. (Correio Braziliense)


“É fundamental que as autoridades de todas as instâncias se balizem pela ponderação”

Por Délio Lins e Silva Jr

29/01/2023 06:00

Após as depredações ao patrimônio público na Praça dos Três Poderes, no último 8 de janeiro, tivemos questionamentos sobre a autonomia do Distrito Federal. Se teria sido um erro dos constituintes, em 1988, conferir a autonomia nos termos do artigo 32 da Carta Magna. Certamente, não é ocasião para isso! O Distrito Federal não apenas sedia a União e representações estrangeiras em nosso país, mas nele vivem quase três milhões habitantes, que não podem prescindir de uma gestão governamental para atender às complexidades que envolvem o viver aqui.

Nada justificaria abolir a autonomia, seja por outras instabilidades políticas do passado, seja pela depredação recente que, pela Seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF), repudiamos publicamente. Todos os atos criminosos devem ser investigados e dentro do devido processo legal, com respeito às prerrogativas da advocacia e direitos de cidadanias assegurados, ampla defesa e contraditório. Entendemos que devem ser punidos os que forem culpados por ações ou omissões e devem ser soltos e inocentados os que comprovadamente não incorreram em crime.

A OAB/DF, como instituição pilar da democracia, não poderia atuar de outro modo que não pela lisura das apurações, pela garantia do cumprimento da lei e pela justiça. Não podemos nos esquecer de que estamos lidando com vidas e que todas merecem que lutemos pelos seus direitos humanos. A escalada de violência, por polarização política, não interessa à sociedade brasileira e precisamos evitar que a barbárie seja normalizada.

Dito isso, é fundamental que as autoridades de todas as instâncias se balizem pela ponderação, porque é de pacificação social que precisamos, serenidade e capacidade de conduzir boas soluções.

Tivemos a informação de que foi apresentada no Senado Federal uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) propondo a federalização permanente do aparato de segurança do Distrito Federal. Pela proposta as polícias civil, penal e militar, hoje subordinadas ao governador, passariam a ser lideradas pelo Presidente da República, que indicaria os respectivos comandantes e, também, do Corpo de Bombeiros. Mais uma previsão no texto da PEC é instituir sabatinas no Senado para a escolha de comandantes, a exemplo do que ocorre com ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

Essa PEC é um ledo engano, pois não resolve questão alguma fora do âmbito de tudo o que aconteceu, ou seja, da política. Destituir a autonomia do governador nessa área, ou questionar por inteiro a autonomia do Distrito Federal, é romper com a atual lógica do nosso pacto federativo. O que menos precisamos é de ruptura.

O amargo remédio da intervenção federal na área da segurança, e que tem amparo no artigo 34 da Constituição Federal, nas palavras do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva veio para “pôr termo ao grave comprometimento da ordem pública”. Essa medida recebeu a aprovação do Congresso Nacional e está em curso, vale até 31 de janeiro de 2023, tempo para o interventor requisitar os recursos financeiros, tecnológicos, estruturais e humanos do Distrito Federal necessários à pacificação social pretendida.

Reafirmamos que as investigações podem e devem ir a fundo no interesse de toda a sociedade, mas tão logo se satisfaçam essas questões ligadas ao desbaratar as ações criminosas, o que deve ser restabelecida é a competência do DF na área da segurança, tanto quanto é como funciona em outras unidades da federação.

Nada substitui o voto nas urnas, as escolhas dos eleitores. Devemos aguardar com serenidade os esclarecimentos e que tudo possa caminhar em ambiente de respeito aos princípios constitucionais.

A governadora em exercício, Celina Leão, montou um grupo, o Gabinete da Preservação e Mobilização Institucional, para tratar da estabilidade e do bom funcionamento do DF, sendo que a OAB/DF já participa. Imediatamente após os atos de vandalismo tivemos uma reunião de alinhamento no Palácio do Buriti para enfrentar as urgências. Além da Seccional e do Conselho Federal da Ordem, estiveram presentes o Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios (TJDFT), o Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), a Câmara dos Deputados e a Defensoria Pública do DF. Todos seguem fazendo o seu trabalho cotidianamente e defendendo valores democráticos.

Atribui-se a Winston Churchill a célebre frase: “Democracia é a pior forma de governo, à exceção de todas as demais formas que têm sido experimentadas ao longo da história”. Concordo! Sejamos democratas! E para isso é preciso mais do que discurso, é necessária a sensibilidade e a prática cotidiana da democracia que pretendemos para nós e para os outros. Não à federalização! Sejamos, sempre, democratas!

*Délio Lins e Silva Jr. é presidente da Seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF)

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